21 de janeiro de 2007

// os pobres têm leis para si? //

Laura,

Admito que o teu comentário quase me comoveu... É, de facto, bonito pensar que em Portugal se fazem leis a pensar nos pobres... A nova lei do aborto poderá ser até uma nova porta para as pessoas com menos bens mas não te esqueças que essas são as mesmas pessoas que poucos recursos têm para adquirir medicamentos, pagar as taxas moderadoras da saúde, permanacer no hospital após uma cirurgia, entre outras situações...

O aborto terá de ser muito comparticipado pelo estado para que os pobres possam usufruir dele... E os ricos... Esses continuarão a poder "apanhar um avião e ir ao Reino Unido ou apanhar um comboio e ir a Badajoz"... Ou terão no mínimo a sua tarefa facilitada ao ver entrar Espanha por aí dentro com novos "franchisings" além dos prontos-a-vestir...

Maria José Morgado, a "cidadã e jurista", teve muita razão quando falou dos circuitos sujos por onde se movimentam os negócios do aborto... Mas esteve muito mal ao dizer que a solução era legalizá-lo (ou despenalizá-lo, como preferires)... Em Portugal, o dinheiro sujo abunda noutros circuitos como o tráfico de droga ou a corrupção e penso que não é objectivo de nenhum de nós despenalizar essas actividades...

Se os "dealers" começarem a deduzir no IRS toda a droga que movimentam e os consumidores virem um anexo especial na sua declaração de impostos sobre o investimento em estupefacientes reslizado no ano transacto, penso que não teremos um maior controle da situação... E penso que os benefícios que daí adviriam não compensariam a perda total de credibilidade da justiça inerente a essa submissão...

Despenalizar o aborto, é legalizar o seu lobby... Aquele lobby que referiste e que defines como um circuito em que "o dinheiro vai ser sempre sujo e as clínicas, por serem clandestinas e os únicos de recursos de muitas mulheres que decidem fazer aborto (porque sempre as haverá), colocam os preços que lhes apetecer"...

E Maria José Morgado, a "cidadã e jurista", demonstrou pouca audácia... Pouca vontade de mudar a clandestinidade através da luta e não da submissão...

Foi a minha interpretação... Pode ser errada, mas não será de certo única...

Saudações...

20 de janeiro de 2007

// declarações infelizes //

Foi com grande espanto que assisti na televisão às mais recentes declarações da Exma. Sra. Procuradora-Geral Adjunta Maria José Morgado...

Trata-se duma das mais notáveis magistradas do Ministério Público Português cujo trabalho se foca frequentemente no combate à corrupção no país à beira mar plantado (recorde-se o processo Apito Dourado"...

Dia 17/01/07, Maria José Morgado teve a oportunidade de tecer alguns comentários na "qualidade de cidadã e jurista" acerca da temática que aqui abordo na Assembleia da República, numa conferência organizada pelo grupo parlamentar do PS e intitulada "Sim à Despenalização da Interrupção Voluntária da Gravidez".... Defendeu que o aborto ilegal "é um negócio de dinheiro sujo" que potencia a corrupção, comparando algumas clínicas que realizam abortos em Portugal às "slot machines" dos casinos.

Quis com isto dizer, que o voto sim no referendo de dia 11 de Fevereiro é a decisão mais responsável e aquela que evita o catapultar das situações explicitadas...

Bem, isto é, no mínimo, preocupante... Trata-se, na minha opinião, duma situação clara de submissão ao poder do "lobby abortivo"... Hoje em dia são os senhores dos negócios sujos que lucram com o aborto mas quem lucrará após a sua (provável) despenalização?! O governo?! As clínicas privadas?! Quem me garante que as últimas não possam ver em Portugal o potencial para forrarem os seus cofres, aliciando o aborto em jovens que o possam vir a fazer duma forma não irreflectida, mas imatura?!

E, acima de tudo, quem me garante ver na Procuradora-Geral Adjunta uma firmeza e uma vontade de resolver alguns dos problemas de corrupção deste país maiores do que aquela atitude submissa e incrivelmente derrotista que a "cidadã e jurista" Maria José Morgado patenteia nos seus comentários?! É a isto que estamos entregues?! É nisto que depositámos esperanças num Portugal mais justo?!

Duvido...


Outras declarações infelizes foram as do Sr. deputado do PCP Bernardino Soares
Passou muito despercebido, mas o facto de ter acusado o Ministro da Saúde de defender o "não" à interrupção involuntária da gravidez em plena Assembleia da República foi um desrespeito total pela liberdade d escolha e de expressão, demostrando esquecimento imperdoável por personagens históricas do seu partido que lutaram e sofreram para que um referendo como o que veremos no dia 11 fosse possível...

Às vezes convém reflectir um pouco...

À atenção dos meus caros visitantes...

// pontos pequenos //

Ines Gonçalves,

O teu comentário foi bastante equilibrado... Gostaria de me demorar um pouco mais neste texto mas penso que o anterior já foca algumas das tuas questões (chamemos-lhe assim...). No entanto, não poderia deixar de reflectir sobre um ou dois pontos...

O primeiro prende-se com as salas de chuto (e, possivelmente, com muitos dos exemplos que se possa trazer à baila...). Na minha oínião, é um pouco linear reparar que o balanço gasto/ganho é bem diferente... Não te esqueças que nas salas de chuto previne-se a tal questão da saúde pública sem prejuízo nenhum para terceiros... Quando falamos do aborto, estamos a referir-nos ao mesmo "ganho" mas em que aquilo que "gastamos" é uma vida, quer queirámos quer não... Perde-se uma vida, um ser...

E, evoluindo pela lógica da sabedoria popular, "mais vale prevenir do que remediar", e poderás chegar rapidamente à conclusão que o aborto, na esmagadora maioria das situações, é perfeitamente evitável pelo uso de métodos contraceptivos (quando um não é eficaz, vários podem ser usados simultaneamente...) e através dum planeamento familiar efectivo...

Despenalizando, criam-se as condições para que algo seja normalmente repudiado e simultaneamente intocável...

Fico contente por ter despertado a tua atenção e pela consideração que transmitiste à minha iniciativa... Conto com a tua presença ao longo das minhas entre-linhas, podendo, de vez em quando, eu próprio ter o prazer de ler as tuas próprias reticências...

// a lei, a lei, outra vez a lei... //

Sara Damaia,

Não acho que sou aquele ser terrível que busca prazer na desgraça dos outros ou busca prazer no sangue derramado...

Não acho mesmo que seja aquele tipo de pessoa que acha que qualquer crime seja punido com pena de morte e que, quanto ao caso particular, ele seja praticado de ânimo leve (pelo menos para já...).

Contudo, aquela frase "polémica" que referiste no teu comentário vem a propósito dum princípio que eu acho que deve ser primordial para o bom funcionamento duma sociedade: a igualdade... Como podemos esperar um bom funcionamento do nosso sistema judicial se por um lado achamos que certos crimes não devem ser punidos...?! Por isso, eu acho que um aborto feito no desrespeito da lei vigente deve ser punido de acordo com a mesma, tal como outro crime qualquer...

Daqui partimos para a questão principal: deverá o aborto ser despenalizado?!

Ora bem, eu até posso admitir que três anos seja uma pena pesada... Mas temo não conseguir conceber a limitação do número de abortos ao abrigo duma lei que o considera crime não passível de pena... É isso que todo este processo de reflexão teórica que levantaste em torno da questão que nos será colocada no dia 11 de Fevereiro não prevê e nunca poderá assegurar...

Receio que muitos apoiantes do "sim" não aceitem o aborto "em si mesmo" como um acto positivo... Mas mesmo assim optem pela despenalização duma mulher por razões relacionadas com a carga psicológica subjacente ao acto...

Portugal não funciona à base da rédia curta... (e não estou aqui a defender a rede apertada...) E a ausência de rédea trará mais diferenças, mais desigualdades, mais injustiças, mais mortes, mais problemas psicológicos mas (enfim) menos problemas de saúde pública e humilhações...

Será a vida um bom preço a pagar?!

[pergunta ou reticência...]

14 de janeiro de 2007

// fundamentalismo //

[no rescaldo de comentários anteriores...]


Musa,

O meu objectivo é, de facto, tentar perceber as razões que possam sustentar o "sim"... Por isso decidi abrir este espaço no blog para que que eu pudesse mostrar o meu ponto de vista e para que todos aqueles que por aqui aparecessem e não se importassem de partilhar o seu próprio raciocínio debatessem este tema...

Por isso coloquei perguntas no meu primeiro post sobre a matéria... Por isso aguardo ansiosamente por reticências e por novas maneiras de abordar o aborto...

Acredito que é bastante difícil incutir em pessoas irredutíveis nas suas convicções o pensamento contrário... Tal como eu não mudarei de ideias, tu também não o farás, decerto... Mas penso que é saudável trocarmos (mesmo que uma última vez) as nossas frases, mais ou menos acaloradas mas sempre com sentido de responsabilidade e respeito mútuo... E eu sei que tu o tens...

No último "post" fui polémico... Talvez tenha feito relembrar algumas de biologia... Talvez me tenha exprimido duma forma menos sarcástica, menos leve... Talvez tenha feito uma interpretação nua e crua daquilo que é o conceito de lei e de pena...

Os actos, no mínimo, ficam para quem os pratica... A decisão de ir a Espanha ou abortar ilegalmente em Portugal pode imiscuir-se nos parâmetros legais, financeiros... Mas nunca nos valores porque a dignidade não se compra e acredito que uma mãe que tenha coragem para abortar (pelos mais variados motivos) o faça em grande condições de stress... E a humilhação venha a ser sentida não por estar numa barra de um tribunal, mas sim por cair na realidade do seu acto...

Porque no dia em que o aborto for efectuado de ânimo leve, estamos perante um novo método contraceptivo e o efeito avalanche assolará Portugal tal como poderá vir a assolar Espanha no futuro...

A tvi optaria certamente por entrevistar uma abelha e perguntar-lhe porque razão não se fazem abortos nas colmeias (perspectiva do "não") ou então optaria por ir a um orfanato ou a uma familia miserável buscando a miseriórdia do aborto (perspectiva do "sim")...

Eu unicamente faço as minhas próprias reticências... Concordo, discordo, faço polémica ou muito simplesmente meto nojo... Mas não caio no erro de não pensar pela minha própria cabeça e de não ouvir (ou ler) cada palavra que me é dirijida...

O tempo não esquecerá o que aqui for dito...


[gosto ainda mais de ti...*]

// justiça // saúde pública //

[para melhor compreender esta reticência, será melhor lerem previamente o comentário do post "// contra //"...]


Laura,

Realmente, do ponto de vista médico, podemos abordar o aborto de acordo com as nossas convicções éticas ou de acordo com aquilo que julgámos ser os princípios básicos da saúde pública...

Tu achas que o aborto, quando realizado clandestinamente, torna-se um problema de saúde pública... Eu acho que o aborto, como não está legal, não pode nem deve ser realizado, no seguimento daquilo a que vulgarmente chamámos "lei"... Como tal, a não existência de abortos, não trará os problemas que abordas no teu comentário e a criança que nascerá, tal como os seus pais, deverão ser acompanhados e apoiados por uma segurança social responsável.

Agora, o ponto de vista da humilhação da mulher aquando do julgamento é algo que me fascina... Porque não há maneira de eu o conseguir entender... Até podemos partir do princípio que a lei é pesada e que não faz sentido alguém que cometeu um crime como o aborto ser presa juntamente com toda uma panóplia de transgressores da lei... Mas isso é falsear a questão! O facto é que em Portugal, salvo algumas excepções, é proibido realizar um aborto e, como tal, toda e qualquer pessoa que o faça, tem de se sujeitar às barras dos tribunais!!

No meu ponto de vista, a humilhação não é ser julgada num tribunal... A humilhação é transgredir a lei!!! O facto de ser julgada em tribunal é apenas uma consequência...

Estaria até na disposição de ver a lei do aborto ser menos pesada... Nunca abolida!

Quanto às questões das salas de chuto, trata-se de um caso totalmente diferente, em que a dimensão ética e científica não permite causar qualquer espécie de sombra na do aborto. Além disso, a existência de salas de chuto não liberalizaria totalmente o uso de drogas... Não nos podemos esquecer que na questão do aborto estámos não só a falar da saúde da mãe - física e psicológica que é, em princípio, salvaguardada na lei actual - como também da sobrevivência de um outro ser...

Não confundamos as situações...

E finda mais uma reticência...

[deixem a vossa...]

13 de janeiro de 2007

// contra //


1 // liberdade // direito a vida // caberá a algum ser humano a decisão de poder optar entre a vida e a morte de outro ser humano?

2 // potencial // existem pessoas condenadas previamente a uma vida miserável e infeliz? Meios conflituosos e famílias com poucas condições são à partida entraves à felicidade, sabedoria e papel que o bebé poderá um dia vir a desempenhar no mundo?

3 // economia // num país estrangulado financeiramente, onde os impostos sobem diariamente, as urgências de hospitais e as maternidades encerram por motivos económicos (entre outros)... há dinheiro para financiar abortos?!

4 // demografia // num país em que a taxa de natalidade não permite o rejuvenescimento da população, faz sentido legalizar o aborto – utilizado como política anti-natalista em países como a China?!

5 // ciência // será que à 4ª semana de gravidez (período em que a mãe muitas vezes ainda nem sabe que está grávida) não encontrámos um embrião com um elevado grau de desenvolvimento, munido já de algumas estruturas primárias?

6 // lei // a lei vigente em Portugal sobre a matéria data de 1984 e aceita o aborto em determinadas condições (malformação do feto, risco de saúde para a mãe, violação).

7 // história // o julgamento de Nuremberga condenou as iniciativas nazis de realizarem abortos em campos de concentração, apelidando essas situações de crimes contra a Humanidade. O que mudou desde então?

8 // crime // desde quando legalizar um crime é uma solução para o mesmo? Deveremos legalizar também os homicídios, os roubos, as fraudes? O aborto deixa de ser um grave problema social só porque foi legalizado?

9 // mentalidade // com os dados mais recentes de utilização da chamada “pílula do dia seguinte”, até que ponto não poderemos pensar que com a mentalidade vigente no nosso país o aborto não se tornará a médio, longo prazo um simples método contraceptivo com prejuízos graves á saúde da mãe?!



[apenas alguns pontos em fase de estudo... outros se seguirão...]

2 de janeiro de 2007

Reina (adapt.)

[dois ou três pensamentos encadeados de um longo rol de sentimentos escritos e de outros que nunca poderão passar a barreira do materializável]
Reina o escuro onde outrora brilhava a tua presença
Reina a solidão quando não estou habituado à tua ausência
Assimilei todos os teus ensinamentos da vida
É com eles que saro esta terrível ferida
E em seguida, caminharei para o infinito
Naquele que dizias ser o meu caminho desde pequenito...

Reina o teu olhar alegre na minha felicidade
sorrio e sinto que não merecia tamanha maldade
reina o teu olhar melancólico na minha amargura
é triste, mas a vida continua…

[Jan. 2005]

[incrível como um singular se transforma num plural sem ser preciso dar aso a toda essa maquinaria gramatical que temos ao nosso dispor... e é bom poder mostrar ao mundo que há coisas que não se esquecem... e que novos crespúculos surgem sem que, muitas vezes, nós consigamos reparar... voces estão no meu coração...]

[e mais não digo...]